quinta-feira, 22 de julho de 2010

As múltiplas faces da violência.

A televisão brasileira tem se especializado ao longo dos anos em cobrir de maneira sensacionalista, e também por isso exaustiva, escândalos e crimes que incitam a comoção nacional e nos fazem pensar a cada momento quais são esses valores adotados, por meio dos quais, parafraseando o rapper, escritor, cineasta e ativista MVBill, “a morte de um artista é uma tragédia e a morte de milhões apenas estatística”. O tema desta semana, notadamente se destina as concepções sobre a violência, principalmente em relação aos grupos “minoritários” ou “fragilizados”, e por esse mesmo motivo (por contradição) é abrangente, não circunscrito a leitura de casos específicos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi homologada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948, tendo como objetivo garantir a defesa dos direitos fundamentais à vida e à dignidade humana - algo tão violado no período de guerras que se antecedeu. Mais de meio século depois, alguns desses direitos propostos sequer estão assegurados para grande parte das populações. O absurdo, no entanto, é a própria existência de leis para “proteção do DIREITO à vida e à dignidade” do outro, já que estes direitos fundamentais são amplamente violados! Em nossa sociedade são as crianças, idosos, mulheres, homossexuais, negros e índios, entre outros, que compõem o grupo dos “excluídos sociais” (sem rotulações), por não terem seus direitos protegidos.

A violência, assim como uma gama extensa de outros fenômenos, tem ocorrência global. As suas formas podem ser as mais variadas: física, psicológica ou social. A violência física, que é para muitos o arquétipo da própria “Violência” tem grande incidência em sua forma “domiciliar”; assim como a violência psicológica. Enquanto isso, a violência social está expressa em quase a totalidade da nossa vida em grupo. A violência é, por consideração, sempre gerada por indivíduos, grupos ou instituições que acreditam ter o poder sobre os demais e que defendem a qualquer preço seus valores e interesses, desprezando de maneira agressiva, os que deles distinguem. Isto é, promovendo a punição, inacessibilidade a instrumentos sociais, à participação social, à comunhão de valores culturais etc. E o reflexo mais claro disto tudo é a exclusão que gera frustração e mais violência, em um espiral extremamente perigoso.

Os mesmos “valores e interesses ou poder” que levam o homem a matar a amante ou a ex-namorada, ao pai matar a filha, ou mesmo ao padre abusar da criança, não são, evidentemente, exclusiva de mentalidades criminosas e perversas (paras os crédulos). É coerente que detêm em seu substrato características de ordem social que promulgam sua possibilidade de existir. Já conhecemos a imagem desvalorizada e fragilizada da mulher, da passividade e obediência infantil, da incapacidade do idoso, da periculosidade dos menos abastados ou da ignorância do negro, aqui no Brasil. As representações sociais que circulam em nossa sociedade não só transportam conhecimento em linguagem do senso-comum, como também estão carregadas de juízos de valores. São, nada mais nada menos, que produtos do meio social, construídos e reescritos na relação entre os indivíduos, grupos e instituições.

Em geral, as pessoas sempre têm um comentário a fazer sobre os crimes que são destaques e recordistas de audiência na mídia. Procuram culpados, identificam provas, julgam, sentenciam, mas não se apercebem que o fazem na verdade, quase sempre em função de uma lógica dominante, imersa nos valores culturais seculares de uma sociedade ainda muito atrasada na defesa dos direitos humanos. Logo, para os chamados “bodes-expiatórios” (descrito por Sawaia) que “têm respeito pelo poder e temem os poderosos” e que seguem a regra geral estabelecida, onde vigora o sexismo, o autoritarismo, a homofobia e o racismo, ainda faz sentido que a culpa seja imputada à mulher violentada, à criança agredida, ao idoso roubado, ao pobre faminto, ou ao negro abusado.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Olhos fechados para o desastre.

Caros leitores, férias terminado para uns, começando para outros, e as atividades do Blog retornam com todo o gás. Nestas ultimas semanas, o Brasil vivenciou episódios únicos de celebração em virtude dos resultados obtidos pela Seleção Brasileira de Futebol na Copa do Mundo da África. No mesmo período, na região Nordeste do país, os festejos juninos costumam tomar de alegria os corações de seu povo tão sofrido. A alegria no Nordeste, entretanto, foi interrompida pelas fortes chuvas nos estados de Alagoas e Pernambuco, deixando para trás um rastro de aniquilamento, mortes e desolação, similares talvez, àqueles desastres que recaíram sobre países subdesenvolvidos da Ásia, aos quais damos pouca ou nenhuma importância.

As semelhanças, de fato, parecem não acabar por aí, principalmente no que diz respeito à repercussão (existiu?) da tragédia na sociedade brasileira. O espírito de união e fraternidade que embalam as massas parece estar dirigido unicamente para a África e, antes que isto soe estranho, não cometamos injustiças: “dirigidos unicamente para os jogos da Copa do Mundo e não, especificamente para o também injustiçado continente. Doutro modo, é ainda assim absurdo o descaso generalizado em torno da questão. A pouca solidariedade nos obriga a pensar sobre a fundamentação e importância do altruísmo em nossa sociedade.

Como já instituído pela Etologia, o comportamento dos seres humanos não pode ser estudado tomando-se apenas como referencia o seu ambiente atual. Assim, o altruísmo humano originou-se e foi selecionado pela natureza, genericamente, em função deste tipo de comportamento beneficiar e proteger a espécie em um ambiente consideravelmente hostil. Entretanto, como bem observado pelo antropólogo Kroeber, o processo evolutivo anulou parcialmente os instintos e “o homem age, [atualmente], de acordo com os seus padrões culturais”.

Neste mesmo sentido, Skinner cita que “[...] muitas das novas práticas culturais desgastaram ou destruíram certas relações entre o organismo e o ambiente [...]”. Pare ele, as praticas culturais evoluíram rapidamente e a seleção natural foi incapaz de acompanhar esse ritmo. Hoje, algumas características adquiridas anteriormente estão enfraquecidas ou podem não ser mais úteis, na medida em que o homem não sofre mais com determinadas pressões ambientais. Não necessita, portanto, adaptar-se porque pode agir sobre o ambiente e transformá-lo para sua maior comodidade. Assim, a “predisposição” a ajudar parece ter perdido espaço neste novo mundo. Isto não equivale dizer, entretanto, que esta desapareceu. O altruísmo enquanto “ajuda sem interesses”, abriu espaço a formas de altruísmo como o nepotista, onde a ajuda é destinada a indivíduos que compartilham genes (favorecendo a perpetuação daqueles que figuram como uma cópia do altruísta) e o recíproco, onde os indivíduos trocam favores por baixos custos, compartilham atividades e interesses e são impelidos a ajudar outrem, que outrora o ajudou frente às necessidades (muito comum entre membros próximos de determinada comunidade).

Não quero dizer com esta argumentação que estes modelos de interação altruística são pejorativos ou amorais, afinal a resultante é quase sempre benéfica aos seus membros. O interessante é perceber, como Keesing (em sua Teoria Moderna sobre a Cultura), que “os componentes ideológicos dos sistemas culturais podem ter conseqüências adaptativas no controle da população, da subsistência, da manutenção de ecossistema etc”. Exemplificando a idéia e trazendo-a para a nossa discussão, teríamos que os sistemas culturais agem sobre nosso comportamento, portanto também sobre o nosso “ser altruísta”, determinando controle e a sobrevivência de outros sistemas e seus membros.

Tomemos como exemplo a repercussão que as enchentes no estado de Santa Catarina produziram em nossa sociedade e observemos em que medida a visão de mundo de uma sociedade, que por sua vez influencia comportamentos, é composta por idéias dominantes. As regiões Sul e Sudeste são consideradas as mais desenvolvidas do país, derivando daí, antecipadas premissas sobre a superioridade de seus residentes (Ideologia Dominante); A sociedade, portanto possuía uma “dívida” com este povo. Era fundamental ajudá-los, afinal naquele momento, eram todos “indiferentemente” brasileiros. Campanhas gigantescas foram iniciadas para ajudar as vítimas (Idéia que conduz ao altruísmo) e foi grande a mobilização social neste sentido, inclusive na região Nordeste.

No acontecimento recente, a dramaticidade do fato é a mesma, o desastre talvez muito pior. Mudou-se a região atingida, mas não se modifica facilmente as concepções e representações (dominantes) que organizam a sociedade brasileira. Isto sim parece explicar muita coisa...

terça-feira, 8 de junho de 2010

Curiosidade sobre o sexo

Para complementar as informações da postagem anterior e aguçar um pouco mais a curiosidade do leitor acerca do tema, trago abaixo alguns exemplos interessantes que nos fazem ter a idéia de que pensar sobre qualquer tipo de comportamento relacional a determinada cultura é pensar sobre a estrutura dessa sociedade e não, evidentemente, questionar o quanto de “loucura” está inserido neste.

Os motivos para a existência de determinados comportamentos dentro de uma sociedade pode, aparentemente não ter racionalidade ou uma racionalidade sustentável, porém ao submergir no universo cultural desta, pode-se perceber o quanto de racional ou instintivo existe na edificação daquele comportamento.

Cali, na Colômbia: uma mulher só pode ter relações com seu marido, quando na primeira vez que isso ocorrer, sua mãe estiver no quarto para testemunhar o ato.

Lógica: o ritual da primeira relação entre marido e esposa, exige à função da mãe para testemunhar se de fato o casamento foi consumado, pode ser extremamente necessário para corroborar o casamento e até mesmo, para motivar em orgulho as partes envolvidas na situação.

Guam: alguns homens mantêm o emprego em tempo integral de viajar por todo território para deflorar virgens, que pagam pelo privilégio de ter sexo pela primeira vez.

Lógica: a razão primeira da promoção deste comportamento é que a legislação de Guam proíbe as mulheres de se casarem virgens, outras razões, como o papel pormenorizado das mulheres na sociedade e o papel/status relacionado aos homens também devem ser considerados.

Maryland: preservativos podem ser vendidos em máquinas, entretanto somente em lugares onde são vendidas bebidas alcoólicas para consumo no local.

Lógica: razão médica ou de controle populacional, tal qual a China, leis como estas circundam o comportamento sexual dos indivíduos.

Brasil: em função da própria geografia (extensão geográfica) e a fatores de cunho político e religioso, em diversas regiões do país as concepções e o comportamento sexual dos indivíduos são notadamente diferentes.

Em algumas cidades do Nordeste: a sexualidade, em especial feminina, é supervalorizada, e em paradoxo desvalorizada. Em função de fatores como pobreza, atrativo turístico e por conseqüência a grande movimentação de renda; quadrilhas se formam para a exploração sexual de mulheres, muitas delas ainda menores, são atraídas pela possibilidade real de trabalho e dinheiro.

Em contrapartida, ainda no Nordeste: em muitas cidades do interior, as mulheres são casadas virgens em casamentos arranjados por seus pais. Em cidades mais pobres também, a intervenção da igreja é ainda muito presente e os dogmas religiosos são seguidos a fio.

Em regiões mais desenvolvidas, como a Sudeste: o alcance da tecnologia e das redes digitais também se relaciona ao comportamento sexual. O acesso facilitado a conteúdos relacionados a sexo é realizado cada vez mais por indivíduos de menor idade e contribui em larga escala para a promoção do contato mais cedo destes indivíduos com o sexo; ao passo que, a falta de informação nesta mesma sociedade contribui para o aumento considerável dos índices de gravidez na adolescência e dos portadores de DST’s.

Sexualidade em foco: da parada gay ao dia nacional do sexo.


Aconteceu em São Paulo, neste último domingo, 06 de Junho, mais uma Parada do Orgulho GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais), popularmente conhecida como “Parada do Orgulho Gay“. A manifestação, já presente em diversos estado e cidades do Brasil, ocorreu pelo 14º ano e bateu mais uma vez recorde de público; estima-se que mais de 3 milhões de pessoas de todas as partes do país e também do restante do planeta participaram do evento.

A sexualidade e suas questões circundantes são seguramente os primeiros colocados no que se refere à repercussão e polêmica. Aparentemente, nenhuma cultura ou sociedade escapou das problemáticas oriundas do tema e até por isso, sancionaram ou vetaram comportamentos, assumindo o controle sobre a vida sexual dos indivíduos. O sexo sempre foi constituído de tabus e crenças, pelos quais algumas instituições como a Igreja e o Estado detinham o controle sobre o comportamento dos indivíduos, ampliando, inclusive, tal controle a outros comportamentos encadeados. Naturalmente, quando se adota juízos de valores e códigos de conduta que referendam e controlam o comportamento de seus participantes, os ditos “fora da norma” são SEMPRE prejudicados, excluídos, perseguidos ou mesmo exterminados.

Muitas sociedades ao redor do mundo condenam o homossexualismo, algumas de maneira declarada, outras nem tanto. Contudo, o que se perceber de maneira comum é a sobrevivência do preconceito, passado ideologicamente através das gerações que se seguem.

Na idade média, por exemplo, a Igreja dotada da noção do pecado, provocou a perseguição de muitos homossexuais através da inquisição, pois a homossexualidade era considerada um “desvio da fé” (Atualmente são as Igrejas pentecostais que realizam uma verdadeira cruzada “anti-homossexuais”). Já no séc. XX o homoerotismo deixa de ser considerado pecado e a homofobia alcança a ciência. Pesquisadores de diversas áreas, com destaque para a saúde, empenham-se em caracterizar a homossexualidade como doença. Nem mesmo o saber “psi” escapou de contribui negativamente para a perpetuação do preconceito. A Psiquiatria transformou a sexualidade em algo de ordem exclusivamente biológica (neurológica), assim os homossexuais eram considerados portadores de alguma disfunção, passível de ser resolvida a base de medicamentos. A Psicologia, até passado recente, tratava o homossexualismo também como patologia, entretanto algo relativo aos “desvios de conduta”, em função das relações entre gênero e sexualidade - estabelecidas arbitrariamente pela cultura e sociedade.

É bem verdade que muitas modificações sociais ocorreram, facilitando senão a quebra do preconceito, à maior aceitação do “diferente”. Ainda assim, apesar de todas as informações e avanços o fenômeno da “patologização” da homossexualidade ainda persiste, como por exemplo, na tão conhecida relação homossexualismo X fatores de risco (DSTs, violência, etc.). A Psicologia, em todos os seus vieses, conseguiu construir um conhecimento sobre a orientação sexual - com destaque para a Psicologia Social e suas contribuições sobre a sexualidade, gênero e identidade - que está distanciado dos preconceitos de outrora (Ainda assim, casos isolados como o da psicóloga e evangélica Rosângela Justino, que oferece “tratamento para curar gays”, possam ocorrer por motivos outros que não aqueles da Psicologia).

A Parada do Orgulho GLBT é, antes, um Movimento Social que aproxima e oferece conhecimento a sociedade brasileira sobre este grupo social. A sua repercussão, longevidade e a participação crescente do público de diversas orientações sexuais parecem indicar uma maior abertura da população brasileira para lidar com temas polêmicos, como a sexualidade. Digo, “parece” visto que, hoje, 8 de Junho, o Jornal Hoje (Rede Globo), informou que a Comissão de Educação e Cultura da Câmara, irá analisar o projeto do ex-deputado Edigar Mão Branca (PV-BA) que pretende criar o Dia Nacional do Sexo, nesta mesma data. Como de se esperar, o projeto não foi bem aceito e sofreu forte oposição e preconceito. É verdade que a aprovação do projeto não corresponde a uma prioridade a ser votada nos três poderes, contudo (e de acordo com o autor da proposta) é [mais uma tentativa] de derrubar o falso moralismo da sociedade brasileira em relação ao sexo e promover, ainda que por um único dia, o diálogo sobre a sexualidade e a própria educação sexual.

E você o que acha dessa proposta?

terça-feira, 18 de maio de 2010

Educação x Violência: Punição aos pais punidores.


Caros leitores, depois de quase duas semanas sem publicações (por motivos acadêmicos), o assunto desta semana é seguramente muito polêmico porque expõe sobre uma prática corriqueira dentro do universo familiar, e porque não, educativo de maior parte das culturas ao redor do mundo: são as "palmadas" [educativas?]. Está sob avaliação da Comissão de Constituição e Justiça (e se aprovado, rumo ao Senado), o Projeto de Lei Nº 2564 /2003, proposto pela Deputada Maria do Rosário (PT), que pretende acrescentar ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a proibição de qualquer tipo de punição física cometida pelos pais contra seus filhos.


O projeto de lei, que será uma emenda ao ECA está, retroativamente, respaldado no próprio Estatuto que defende as crianças e adolescentes, na "Nova" Constituição Brasileira de 1988 (e naturalmente, na Declaração Mundial dos Diretos Humanos), tendo assim, grande chance de ser aprovado e regulamentado. Alguns de seus muitos pontos de justificativa, o PL aponta que é dever do Estado proteger crianças e adolescentes de qualquer tipo de violência; o acordo internacional da Convenção sobre os Direitos da Criança desde 1990 recomenda que os países-membros das Nações Unidas protejam os menores de qualquer tipo de agressão e que para educar são dispensáveis punições físicas, o diálogo é suficiente. Referencia também que 14 países aboliram a punição física de crianças em suas constituições (Suécia, Áustria, Dinamarca, Noruega, Letônia, Alemanha, Israel, Chipre, Islândia, Itália, Canadá, Reino Unido, México e Nova Zelândia) e que, se aprovado cabe aos órgãos legisladores, fiscalizadores e de apoio do Estado, realizar campanha de conscientização do público em relação ao "problema das palmadas".

Mas "o problema" é: o projeto; que é de fato uma bela iniciativa de proteção à criança e adolescente e ao combate da violência já naquelas instituições socializadoras básicas, como a família e a escola; concorre com uma série de problemas na esfera prática. Um dos principais é "Como fiscalizar os descumprimentos da lei?", "Quais os critérios que decidirá que punição será imputada aos pais?", "Como o Estado e a Justiça lidará com essa nova carga (que será seguramente extensa) de processos?", "Como os serviços psicológicos, psiquiátricos, de assistência social, etc., conseguirá dar conta desta demanda anteriormente inexistente?", são algumas das muitas repercussões prática que dificultaram a inserção da lei.


São muitos os ramos e campos de atuação da psicologia que irão compreender o fenômeno das "palmadas" de maneiras diversas. A psicologia social certamente voltaria seu olhar para o contexto onde essa violência ocorre e analisaria a gama outra de fatores que "justificariam" a agressão (como a ligação da frustração, da violência e do poder). A psicologia jurídica centraria nos dispostos que colocaria os sujeitos (agressores e agredidos) como pertencentes de individualidade, subjetividade, histórias e vivências particulares, defendendo a impossibilidade de qualquer tipo de "punição" ocorrer sem que haja a consideração dos fatores únicos pelos quais a infração ocorreu. Até mesmo a psiquiatria poderia analisar os indícios latentes ou não, de possíveis transtornos e patologias psiquiátricas que explicariam as agressões. A psicanálise poderia investigar as causas inconscientes que levaram os sujeitos agressores à passagem ao ato ou analisar a "posição" do agredido em relação à agressão sofrida. Enquanto a psicologia experimental analisaria as contingências referentes à agressão e as conseqüências da mesma nos diferentes indivíduos.

Acredito que o diálogo ainda é uma boa solução para parte significativa dos problemas cotidianos. Mas este tipo de arranjo para solução de problemas é eficaz na medida em que seu uso é freqüente e conseqüentemente os efeitos positivos já são esperados. Quero dizer com isso que com esta lei, dificilmente, pais que educam seus filhos com base nas palmadas conseguiram os efeitos esperados da obediência passando a usar o diálogo. Não quero dizer, por outro lado, que a mudança das palmadas para o diálogo seja ineficaz! Mas é antes, um recondicionamento de respostas e conseqüências que já se estabeleceram há algum tempo e necessitam com urgência serem modificadas: aí está o problema. As palmadas, enquanto punições geram comportamento de fuga e esquiva por parte dos agredidos, o que inibe a interação em novos momentos, porque um de seus efeitos é a generalização da punição a outros contextos.

Existem muitas formas de educar e é importante que sejam evitadas as punições positivas (como as palmadas). É possível educar crianças e adolescentes reforçando-as, quando pertinente, pelas coisas corretas que fazem, ou mesmo suspendendo temporariamente, bens ou atividades que gostam como forma de puni-las (negativamente), mas sem gerar as conseqüências danosas da agressão. Fundamental é estabelecer uma boa comunicação em todas as formas de educação apresentadas a criança ou ao adolescente, visto que é necessário que tenham conhecimento do que é, para seus pais, correto ou não.

A lei "anti-palmadas" pode gerar um problema de ordem social, considerando-se que, "segundo grande parte dos estudiosos neste campo", o comportamento de bater em suas crianças está mais concentrado nas camadas sociais mais baixas, onde o pouco conhecimento dificulta o diálogo. A meu ver, este certamente não é um tipo de análise correta e encobre, na verdade, a tonalidade do preconceito (que é muito próximo daquele "preconceito lingüístico" exposto por Bagno) que permeia a maior parte das investidas no social. Caracterizaremos mais uma vez a "pobreza" como fonte de todos os males da nossa sociedade? A resposta pode ser dada talvez de outra maneira. A televisão brasileira nestas últimas semanas escandalizou a história da procuradora Vera Lúcia Gomes, acusada de torturar (psicológica e fisicamente) uma criança de 2 anos de idade, que pretendia adotar. Ela: procuradora, representante da lei, diplomada, abastarda, agrediu violentamente uma criança de apenas 2 anos. De posse disto, é correto marginalizar ou estigmatizar em determinado grupo, coisas que pertencem a uma cultura geral, violenta? É com essa pergunta que respondo ao questionamento anterior e os deixo pensar a respeito.