segunda-feira, 26 de abril de 2010

O Papa, o Vaticano e a Pedofilia: o retorno do escândalo.

Para iniciar oficialmente as discussões deste blog, abordarei a mais recente polêmica de repercussão mundial. Atualmente, temos observado com angústia e ansiedade os acontecimentos que colocaram o Vaticano e o Papa sobre os olhares “pecaminosos” de todo o mundo. Há algumas semanas, se reacendeu os “boatos” - muitos confirmados - de que representantes da Igreja Católica [Apostólica Romana] haviam abusado de crianças durante o exercício de sua fé. De fato, me pareceu estar presenciando uma notícia um tanto quanto anacrônica, na medida em que já não é a primeira vez (segunda, terceira, quarta ou sabe-se lá quantas) que este tema incide e se dissemina nos meios de comunicação.

A questão é; de acordo com o Cardeal e Secretário de Estado do Vaticano, Tarcisio Bertone, “Muitos psicólogos e muitos psiquiatras têm demonstrado que não há relação entre celibato e pedofilia, mas muitos outros têm demonstrado que há relação entre homossexualidade e pedofilia. Isso é verdade. Este é o problema”. (Fonte: Folha Online)

Seria prematuro e incorreto dizer que uma longa estirpe de psicólogos e psiquiatras não pensam da maneira citada, posto que ninguém está livre dos preconceitos e de basear-se em torno deles. Contudo, sabemos que profissionais como os psicólogos devem permanecer no exercício diário de abster-se de seus valores, moral e preconceitos perante situações nas quais os mesmos possam produzir resultados distorcidos e perigosos nas pessoas e sobre os fenômenos analisados.


As ciências psicológicas há muito se interessaram por pessoas e condutas que desviam da lógica social; esta, pautada na aprendizagem e seguimento dos valores tradicionais, incorporados e reproduzidos culturalmente – dado a isso é possível compreender, parcialmente, as representações que recaem sobre os profissionais destas áreas, por onde o interesse quase sempre se voltou para o “desviante”. Logo, temas como a Pedofilia são recorrentes na literatura da psicologia e psiquiatria.

A psiquiatria - das nosologias - em seu quadro acerca das “Síndromes relacionadas à Sexualidade” entende a pedofilia como um “transtorno do comportamento sexual”, compreendido nas esferas biológica, psicológica e social (com destaque para a primeira). Neste sentido, as fantasias e atividades sexuais do pedófilo são em geral, danosas tanto para “o portador”, quanto para “a vítima”, em função de sua preferência em realizá-las com crianças; podendo ser estas relações homossexuais (pederastia) ou heterossexuais. O tratamento indicado seria o medicamentoso, unido a psicoterapia.

a psicanálise que serviu de base para muitos postulados da psiquiatria, tem na sexualidade grande referência. Conclui que o desenvolvimento sexual (que também é psíquico e assim, inconsciente), em especial na fase da infância, quando permeado por perturbações no relacionamento infantil causa graves repercussões na sexualidade da vida adulta, ou ao menos à predisposição ao desenvolvimento sexual perturbado. A pedofilia pode ser entendida como uma perversão (desvio da atividade sexual “normal” : o coito) em relação ao objeto sexual (no caso, a criança). Para Freud existiam aspectos tanto psicológicos quanto anatômicos (biológicos) importantes no estudo dos fenômenos de ordem sexual, contudo o tratamento psicanalítico seria fundamental para a compreensão das origens da “psicopatia” e redução dos danos para “paciente” (que sofre) e sociedade.

Segundo a psicologia comportamental, a conduta de um pedófilo pode ser entendida enquanto um conjunto de comportamentos (respondentes e operantes) produzido por contingências anteriores e atuais, que se relacionam com o ambiente sociocultural onde os indivíduos interagem. Assim, para cada fenômeno que ocorre existe um evento ambiental que o produziu. Não é plausível conjecturar sobre “processos inconscientes” determinantes da conduta do pedófilo (como na psicanálise), tampouco se basear em diagnóstico generalista e estanque, que desconsidera a individualidade das relações de cada pessoa, para predizer comportamentos futuros (como na psiquiatria). A terapia comportamental é indicada porque atualiza com freqüência as analises sobre as contingências envolvidas na produção do comportamento indesejável, sendo possível o substituir ou mesmo, extinguí-lo.

Para além destas considerações psicológicas, torna-se evidente nas linhas do comentário do Cardeal, o objetivo de encobrir, mais uma vez, a responsabilidade eclesiástica pela ocorrência de tantos casos de pedofilia “aos pés da Santa Cruz”, espalhados ao redor do mundo. A tentativa de compor a “fonte causal da pedofilia” como a homossexualidade não elimina o problema, na verdade impõe com marcado preconceito e irresponsabilidade, culpa inexistente aos homossexuais. Espera-se fielmente, que o documento escrito em 2003 - e agora divulgado abertamente-, que orienta os membros da Santa Igreja a lidar com crimes como a pedofilia, tenha o potencial de reduzir a ocorrência dos fatos, se não pela compreensão dos crimes, pelo temor da punição judicial.